Reforma tributária e regime transitório na atividade de locação de imóveis

28 de janeiro de 2025
Migalhas

1 - A LC 214/25 (de 16.1.2025) instituiu o IBS - Imposto sobre Bens e Serviços (previsto no art. 156-A da CF/88) e a CBS - Contribuição Social sobre Bens e Serviços (inserida no art. 195, inciso V, da CF/88), como passo adicional da reforma tributária aprovada inicialmente pela EC 132/23.

2 - O IBS é da competência compartilhada de Estados, municípios e Distrito Federal, enquanto a CBS é da competência da União Federal, e ambos serão cobrados simultaneamente a partir de 1.1.2026 (art. 544, VI, da LC 214/25), compensando-se esses novos tributos com o PIS e a Cofins, ou até contra outros tributos Federais (art. 125 do ato das disposições constitucionais transitórias). A ideia é que o IBS e a CBS incidam sobre o valor agregado e substituam aos poucos todos os tributos atuais sobre o consumo (PIS, Cofins, ICMS e ISS - mantendo-se o IPI apenas para produtos importados, dentre outros itens específicos).

3 - No que diz respeito às operações com imóveis a LC 214/25 estipulou regimes transitórios opcionais para contribuintes que realizam incorporação imobiliária submetida às regras de patrimônio de afetação (art. 485), bem como para aqueles que promovem alienação de imóvel decorrente de parcelamento do solo por meio de loteamento ou desmembramento (art. 486), e ainda para os que realizam locação, cessão onerosa ou arrendamento de bem imóvel decorrentes de contrato por prazo determinado (art. 487).

4 - O regime transitório opcional pode ser vantajoso particularmente no caso de pessoas jurídicas com atividade de locação de imóveis tributadas no regime do lucro presumido, pois de todo modo já recolhem PIS e Cofins à alíquota conjunta de 3,65% sobre a receita bruta oriunda da locação de imóveis (e continuarão a recolher IRPJ e CSL, que não serão substituídos pelo IBS e pela CBS). Para as pessoas jurídicas nesse ramo submetidas ao regime do lucro real a opção aqui examinada também pode ser interessante, pois pagam PIS e Cofins à alíquota conjunta de 9,25% (na modalidade não-cumulativa). Evidentemente também pode interessar às pessoas físicas, que para tais fins são consideradas contribuintes do IBS e da CBS (nas condições previstas no art. 251 da LC 214/25).

5 - Aliás, tendo em vista que a receita de locação (residencial ou não-residencial) de imóvel geralmente compõe parte significativa dos rendimentos de pessoas jurídicas constituídas como "holding" patrimonial, e considerando que normalmente os contratos de locação em regra vigoram por prazo determinado (relativamente longo), é conveniente avaliar a opção do art. 487 da LC 214/25, que assegura ao menos por certo tempo a alíquota total de 3,65% a título de IBS e de CBS (especificamente para essa atividade).

6 - No caso de contrato de locação não-residencial a opção de tributação à alíquota total de 3,65% é válida pelo prazo previsto no contrato, desde que: (a) o contrato tenha sido firmado até 16.1.2025 (data em que promulgada a LC 214/25), o que se reputará comprovado pelo reconhecimento das firmas ou a partir da assinatura eletrônica das partes; e (b) o contrato seja registrado em Cartório de Registro de Imóveis ou em Registro de Títulos e Documentos até 31/12/25, ou venha a ser disponibilizado para a Receita Federal e para o Comitê Gestor do IBS conforme dispuser o regulamento do tributo.

7 - Na hipótese de contrato de locação residencial, a referida opção é válida pelo prazo original do contrato ou até 31/12/28, o que ocorrer primeiro, desde que o contrato tenha sido firmado até 16/1/25 - o que igualmente se reputará comprovado por reconhecimento de firmas ou por assinatura eletrônica das partes, mas também pela comprovação do pagamento da locação (efetuado até o último dia do mês seguinte ao do primeiro mês de vigência do contrato), dispensando-se, no caso de locação residencial somente, o registro do contrato em cartório ou a disponibilização à Receita Federal.

8 - O IBS e a CBS serão cobrados em paralelo e independentemente da incidência das contribuições PIS e Cofins, as quais serão extintas somente a partir de 2027 (arts. 124 e 126, II, do ADCT - Ato das Disposições Constitucionais Transitórias). 

9 - Durante o ano de 2026 o IBS (com alíquota inicial de 0,1%) e a CBS (de 0,9%) provavelmente seriam inteiramente compensados, sem sobras (no regime de apuração ordinário), contra PIS e Cofins devidos sobre a receita bruta da atividade aqui analisada (locação de imóveis por pessoa jurídica tributada no regime do lucro presumido ou do lucro real). Aliás, segundo a regra de compensação prevista no art. 125 do ADCT, havendo uma improvável sobra ainda assim a compensação poderia ser feita contra quaisquer outros tributos Federais - ou, mediante requerimento, o eventual excesso seria ressarcido em até 60 dias.

10 - A soma das alíquotas do IBS e da CBS e seu dimensionamento ao longo dos próximos anos dependerá de avaliações, pelo Comitê Gestor do IBS, da eficácia de sua arrecadação (dentre outros fatores), mas por enquanto se estima que será observado o teto de 26,5%. Trata-se de norma programática (é fácil constatar) que passa ao largo de uma "garantia". Se tiver que ser superado o teto em algum período isso tão-somente dará ensejo ao envio de um projeto de lei complementar ao Congresso Nacional "propondo medidas que reduzam o percentual a patamar igual ou inferior" àquele parâmetro, conforme art. 475, § 11, da LC 214/25.

11 - Como as alíquotas do IBS e da CBS relativas às operações de locação de imóveis se submetem a uma redução de 70% (art. 261, parágrafo único, da LC 214/25), acredita-se que nessa atividade a carga tributária possa alcançar pelo menos o patamar de 7,95%.

12 - Sendo assim, tudo indica que será vantajoso optar pela sistemática de transição prevista no art. 487 da LC 214/25, ainda que apenas para a receita auferida nos vigentes contratos de locação que puderem ser enquadrados naquela hipótese - pois a tributação conjunta de IBS e CBS, nesse caso, já está categoricamente delimitada em 3,65%.

13 - É certo que em tais circunstâncias não haverá possibilidade de compensar IBS e CBS com PIS/Cofins ou outros tributos Federais, nem existirá a faculdade de pedir sua restituição, e tampouco será aplicável o fator de redução acima referido, além de não ser permitido o abatimento de créditos na apuração sobre o valor agregado (§§ 4º a 7º do art. 487 da LC 214/25) - mas a alíquota previamente assegurada no patamar fixo de 3,65%, comparativamente a um imprevisível e provisório teto de 7,95%, já se traduz em elemento razoável de segurança jurídica quanto à carga tributária, que é imprescindível em contratos de prazo alongado, como ocorre na locação residencial e na locação não-residencial.

14 - De se notar, ademais, que por se tratar de tributação sobre o valor agregado, o contribuinte que optar pelo regime regular de apuração tem direito a apropriar créditos do IBS e da CBS relativos às operações anteriores para abatimento do valor a ser recolhido (arts. 47 a 56 da LC 214/25) - o que dificilmente vai trazer redução significativa na locação de imóveis. Também é importante ter em mente que esse abatimento só pode ser aproveitado com base nos valores do IBS e da CBS que tenham sido destacados em documento fiscal, sob a condição de que os tributos assim destacados tenham sido efetivamente recolhidos (arts. 47 e 27 da LC 214/25).

15 - Nas circunstâncias acima, portanto, é recomendável que todo contribuinte nesse ramo de negócios selecione os contratos de locação submetidos à regra do art. 487 da LC 214/25 e avalie cuidadosamente as medidas a serem adotadas para assegurar que a sistemática de transição ali prevista possa trazer economia legítima - em especial, previsibilidade da carga tributária no curso dos contratos - além de outras consequências jurídicas dessa opção (como por exemplo o direito de preferência do locatário na aquisição do imóvel em igualdade de condições, na hipótese de proposta de compra do bem por terceiro na vigência da locação, em havendo registro do respectivo instrumento na forma do art. 33 da lei 8.245/91).

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